sexta-feira, 14 de maio de 2010

Açores nas Vidas de Maria Filomena Mónica



“Na Páscoa de 1988, fui aos Açores. Gostei de tudo- do verde, do mar, da pronúncia, do nevoeiro, das araucárias, das lagoas, das cidades, dos metrosíderos, dos vulcões, das hortênsias, do chá, dos campos, dos conventos, dos muros, do queijo, dos «impérios», dos solares e até dos arquivos. Habituada à destruição irracional da paisagem do Continente, fiquei estupefacta com a beleza de Angra, uma cidade que, durante séculos, fora escala das naus que buscavam a África, Índia e as Américas.
Ao chegar ao Faial, dei-me conta de que não se deve falar dos Açores como um todo: cada ilha tem a sua personalidade. Talvez exista um fundo de verdade naquilo que Antero Quental dizia, em carta a Oliveira Martins, com data de 26 de Junho de 1874: «Aqui nos Açores há um provérbio que reza: São Miguel, burgueses ricos; Terceira, fidalgos arruinados; Faial, contrabandistas espertos.»
Aparentando achar mais graça à castiça Angra do que à sua cidade natal- Antero nascera em Ponta Delgada -, dizia ser a Terceira «uma terra essencialmente portuguesa e peninsular» por ter «pobreza, toiros, insouiciance sóbria e sófica, entusiasmo, bizarria e parlapatice», enquanto São Miguel seria, na sua opinião, holandesa e, portanto, «o menos português de quantos cantos do mundo onde se fala a língua de Camões». …
Pouco a pouco, comecei a perceber que, mais do que o Continente, os Açores estavam, e estão, ligados ao mundo. Como escreveu John Updike, as raízes de lava podem prendê-los ao passado, mas o mar permite-lhes um cosmopolitismo de que nenhum outro local se pode gabar.”

Vidas, Biografias, Perfis e Encontros, Maria Filomena Mónica, Aletheia Editores
.

Maria Filomena Mónica abalança-se aqui, mais uma vez, ao género biográfico, depois dos seus Cesário Verde, Fontes Pereira de Melo (ambos da Alêtheia), Eça de Queirós (Quetzal), e D. Pedro V (Temas e Debates), para além da sua própria autobiografia, Bilhete de Identidade (Alêtheia Editores).

Polémica, a autora pretendeu «demolir heróis, esquadrinhar as suas vidas, desvendar sentimentos». Dividido em duas partes, o século XIX e o século XX, este livro recupera textos sobre personagens tão díspares como a burguesa família Dabney, do Faial, os reis D. Pedro V e D. Luís, o capitalista conde de Burnay, os «Vencidos da Vida» ou os operários do têxtil, passando depois a retratar os casos reais de um menor em risco e de uma emigrante em Inglaterra, e acabando com uma série de perfis masculinos, sobre a moderna visão do homem, o papa Bento XVI, o rei Juan Carlos, Clint Eastwood, José Sócrates, Francisco Louçã e Aníbal Cavaco Silva.

Sem comentários: