domingo, 28 de março de 2010

Lady Sings The Blues

“ Pode-se estar toda vestida de cetim branco com rosas no cabelo e longe como tudo das canas de açúcar e mesmo assim sentir que se está a trabalhar numa plantação.
De qualquer maneira os músicos brancos andavam a swingar pela rua 52 de uma ponta à outra, mas as únicas caras pretas que por lá havia eram Teddy Wilson e eu. Teddy tocava piano nos intervalos no Famous Door e eu cantava. Não havia apanha de algodão entre o Leon and Eddie,s e o East River, mas parecia mesmo que estávamos numa plantação. E éramos obrigados não só a ver isso tudo, mas também a viver com isso. Assim que acabávamos de fazer o nosso número, nos intervalos, tínhamos que sair pelas traseiras e ficar sentados na rua.”

Lady Sings The Blues, Billie Holiday, Ed. Antígona

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O lançamento da primeira edição deste livro no verão de 56, causou certa polémica. As críticas estranharam várias passagens, como as de prostituta na adolescência, as descrições da sua personalidade e da sua mãe, no entanto este livro contribuiu para um aumento na frequência dos concertos e na venda de dos discos. Lady Sings the Blues, é pois uma metáfora feliz a anunciar um rol de tristezas contadas por uma senhora cantora. Billie Holiday, conta 41 dos 44 anos que viveu, numa linguagem crua, simples com muito calão, a vida que levou com aquela cor de pele, clara para os pretos, escura para os brancos. Mas os testemunhos legados pela cantora, fundamentais para entender o jazz, a sua discografia é a melhor amostra de como um solista usa e recria um tema, com tremenda intensidade e personalidade, num estilo muito expressivo e amargo, que tal como o livro roça muitas vezes o trágico.

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“Foi há muitos anos, ainda Billie estava viva, mas não me esqueço da reacção do locutor da Rádio Renascença quando uma noite metemos no ar um disco dela:
«Está na rotação errada!», disse-me aflito.
«É assim mesmo!», disse-lhe discretamente.”
José Duarte

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