domingo, 13 de maio de 2007

Hitchcock diálgo com Truffaut

Truffaut com Hitchcock



Truffaut - Entre aqueles que o admiram, há quem desejasse vê-lo empreender adaptações de obras importantes e ambiciosas, Crime e Castigo de Dostoievski, por exemplo.

Hitch - sim, mas eu nunca o farei, precisamente porque Crime e Castigo é a obra de outra pessoa. Fala-se frequentemente dos cineastas que, em Hollywood, deformam a obra original. Não tenho a intenção de fazer isso. Só leio uma história uma vez. Quando a ideia de base me convém esqueço completamente o livro e fabrico cinema.

Truffaut - Gostaria de lhe pedir que precisasse agora qual a diferença entre suspense e surpresa.

Hitch - É muito simples. Estamos a conversar, talvez haja uma bomba debaixo desta mesa e a nossa conversa é muito trivial, não se passa nada de especial, e de repente: bum!, explosão. O público fica surpreendido; mas, antes disso, mostraram-lhe uma cena absolutamente vulgar, desprovida de interesse. Agora, examinemos o suspense. A bomba está debaixo da mesa e o público sabe, provavelmente porque viu o anarquista colocá-lo. O público sabe que a bomba explodirá à uma hora e sabe que falta um quarto para a uma - há um relógio no décor; a mesma conversa anódina torna-se de repente muito interessante porque o público participa na cena. Tem vontade de dizer às personagens que estão no ecrã. No primeiro caso, ofereceu-se ao público 15 segundos de surpresa no momento da explosão. No segundo caso, oferecemos-lhe 15 minutos de suspense. A conclusão disto é que é preciso informar o público sempre que se possa fazê-lo, excepto quando a surpresa é um twist, quer dizer, quando o inesperado da conclusão constitui o sal da anedota.


No prefácio do livro Truffaut diz o seguinte:

"o homem estava morto, mas não o cineasta, porque os seus filmes realizados com um cuidado extraordinário, uma paixão exclusiva e uma emotividade extrema dissimulada por uma rara mestria técnica, não mais deixariam de circular, distribuídos por todo o mundo, rivalizando com as novas produções, desafiando a usura do tempo..."


Este livro foi publicado em 1987 pelas publicações Dom Quixote.

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